Em 2022, durante a COP 15 da Biodiversidade, quase todos os países do mundo assinaram um acordo para diminuir o ritmo da destruição dos ecossistemas terrestres. Eles concordaram em proteger 30% de sua área em terra e oceanos até 2030, uma meta que ficou conhecida como “30 em 30”. Entretanto, segundo um levantamento do jornal The Guardian e do site Carbon Brief, mais da metade dos países não estão comprometidos com esse plano.
A “30 em 30” não é a única meta do acordo, que oficialmente se chama Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal (GBF, na sigla comumente usada em inglês). Ele inclui ainda metas de controles de espécies invasoras, redução de subsídios que prejudicam a biodiversidade e recuperação de áreas degradadas.
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Por ser tão amplo, o acordo também ficou conhecido como “Acordo de Paris da natureza”, em referência às metas estabelecidas em 2015 na capital francesa para controle de emissões causadoras do aquecimento global.
Entre os 137 países que enviaram à ONU os seus planos de como cumprir o GBF, 70 (cerca de 51%) não seguem o compromisso assumido em 2022. As propostas ou propõem proteger uma porcentagem menor de território ou são vagas e não se comprometem com uma meta numérica explícita.
Embora a meta da ONU seja global, especialistas apontam que o foco deve ser nas regiões com maior biodiversidade. Existem 17 países considerados “megadiversos” – juntos, eles abrigam 70% da biodiversidade do mundo. Mas sete deles (Indonésia, Malásia, México, Peru, Filipinas, África do Sul e Venezuela) não planejam seguir a meta 30 em 30.
Assim, mais de um terço da superfície terrestre está sob domínio de países que estão voltando atrás nos combinados sobre preservação ambiental.
O primeiro país na lista dos megadiversos é o Brasil, que, por enquanto, está em outra lista: dos países que sequer enviaram os seus planos de como cumprir o GBF. Outros 60 países estão na mesma situação.
Os EUA, o país com a décima maior biodiversidade do mundo, não faz parte do acordo. Eles são o único país-membro da ONU que não integra a Convenção sobre Diversidade Biológica, instância criada em 1992 que é responsável pelas COPs da biodiversidade. Desde a década de 1990, a entrada dos EUA no tratado é barrada por senadores republicanos.
Segundo a edição de 2024 do relatório Protected Planet, que analisa o avanço dos países na meta 30 em 30, 17,6% das águas terrestres e interiores e 8,4% das áreas marinhas e costeiras estão protegidas. O número está aumentando: desde 2020, novos 629 mil km² de área terrestre e de águas interiores e 1,77 milhão de km² na área marinha e costeira foram oficialmente protegidos.
Entretanto, os números ainda estão muito distantes da meta de 30%, e a distribuição das áreas preservadas é muito desigual. Em todo mundo, menos de um quinto das áreas conhecidas como ativos naturais críticos estão protegidas.
A meta 30 em 30 também especifica que a delimitação das áreas de proteção deve ocorrer de forma equitativa e respeitar os direitos de povos indígenas e comunidades locais. As áreas devem ser eficazes, bem conectadas e estrategicamente localizadas nas regiões mais importantes para a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.
Os achados não são exatamente surpreendentes – afinal, historicamente, os governos nunca conseguiram cumprir uma meta dos acordos de biodiversidade da ONU. Entretanto, com o agravamento da crise climática, a pressão para que esse tipo de medida funcione é cada vez maior.
Um estudo de 2014 constatou que, todos os anos, a natureza fornece mais de US$ 125 trilhões em serviços essenciais de ecossistemas que sustentam o bem-estar humano e o desenvolvimento econômico. Esses serviços incluem o fornecimento de água potável e solo fértil, a estabilização do clima e a polinização das culturas que consumimos.
Isso significa que, só de existir, a natureza presta serviços que, se quantificados, seriam equivalentes a mais de 40% do PIB anual da Terra. No entanto, esses serviços geralmente não são precificados e não são contabilizados nos mercados globais. O estudo também constatou que nossa destruição da natureza resulta em perdas econômicas estimadas em US$ 1,4 trilhão por ano, o equivalente a 1,6% do PIB global.
Foi esse tipo de dado que fez com que a perda de biodiversidade e o colapso de ecossistemas fosse listado como um dos cinco principais riscos em termos de probabilidade e impacto na próxima década no Relatório de Riscos Globais 2020 do Fórum Econômico Mundial.
Dezenas de outras evidências científicas que embasam a medida 30 em 30 podem ser encontradas no site da Campaign for Nature, uma organização sem fins lucrativos que defende a implementação do GBF.
“Sejamos claros, essa não é uma meta ‘agradável de se ter’ – mas é essencial se quisermos evitar a extinção de dezenas de milhares de espécies e manter os serviços que a natureza intacta oferece, como polinização, filtragem de água e ar, defesa contra tempestades e prevenção de pandemias”, disse Brian O’Donnell, diretor da Campaign for Nature, em entrevista ao The Guardian.
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