Neste Mês da Mulher, temos uma oportunidade única de refletir sobre isso. Ser formal demais pode transmitir rigidez; a informalidade, por sua vez, pode significar falta de autoridade. Despojamento pode ser confundido com desleixo e assim por diante. O equilíbrio entre sofisticação, modernidade e adequação torna-se um desafio diário, em que a moda, longe de ser apenas uma escolha estética, se transforma em um elemento determinante da credibilidade feminina.
Essa dinâmica expõe uma realidade incômoda: o talento e a experiência de uma mulher não são avaliados em uma página em branco, mas sim através do filtro da sua imagem. Mulheres precisam estar visualmente impecáveis para serem consideradas tão qualificadas quanto seus pares masculinos. Um terno em alfaiataria impecável pode abrir portas, enquanto um vestido vibrante pode ser lido como falta de seriedade. Em um universo onde a primeira impressão ainda pesa mais para elas do que para eles, a moda se torna tanto uma ferramenta de poder quanto uma armadilha silenciosa – um campo minado onde cada escolha carrega implicações invisíveis, mas profundamente impactantes.
Posso mencionar alguns estudos que falam sobre como mulheres e homens são avaliados de forma diferente no contexto do mercado de trabalho. Um estudo que eu gosto muito, pois acho extremamente didático como ele ilustra o impacto dos vieses de gênero na percepção de competência, é intitulado “Efeito Jennifer e John”. Neste experimento, conduzido pela Universidade de Yale em 2012, 127 professores de ciências avaliaram candidaturas idênticas para a posição de gerente de laboratório, diferenciadas apenas pelo nome: metade recebeu o nome “John” e a outra metade “Jennifer”. Os resultados mostraram que “Jennifer” foi considerada menos competente e menos contratável, além de receber uma oferta salarial 13% menor que “John”.
Isto, somente com a avaliação do currículo, tendo como único viés o gênero. Imagine presencialmente, quando a mulher será avaliada também pela sua roupa, corte de cabelo, unhas, sobrancelha. Há uma infinidade de pressões sociais subliminares que, equivocadamente, serão determinantes para definir se a mulher está, ou não, apta a vaga e se está, ou não, apta a uma promoção.
Eu mesma me lembro de uma situação na qual, em uma determinada reunião de avaliação por desempenho, a gestão da época me disse que eu deveria começar a usar roupa de marca e fazer chapinha, se ambicionasse uma maior progressão de carreira. O ponto de melhoria não foi em relação as minhas entregas, não foi em relação a qualidade de resultados, não foi em relação a minha postura mais ou menos assertiva. Foi em relação a minha roupa e ao meu cabelo.
Fico pensando em quantos homens, durante uma reunião de avaliação de desempenho — cujo objetivo é discutir os resultados apresentados à empresa —, já ouviram um feedback sobre o seu cabelo: “Está curto demais”, “liso demais”, “ondulado demais”, “crespo demais”, “careca demais”. Ou sobre a sua roupa.
A moda deveria ser um espaço de liberdade, mas, para muitas mulheres no mundo corporativo, ela se torna um campo minado. As roupas que escolhemos usar não deveriam definir nossa competência, mas a realidade mostra que, para mulheres, a aparência segue sendo um critério de avaliação muitas vezes mais rigoroso do que as entregas e os resultados.
Neste Mês da Mulher, é essencial refletirmos sobre como os vieses de gênero ainda moldam expectativas e oportunidades. Não se trata de negar a importância da imagem profissional, mas de garantir que ela não seja um obstáculo para o reconhecimento do talento feminino. Só teremos mudado essa equação quando mulheres puderem se vestir para si mesmas – e não para atender a padrões que, no fim das contas, dizem muito mais sobre a sociedade do que sobre sua capacidade de liderança.
Nota: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Vogue Brasil.
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