Maria I de Portugal pode até ter ficado conhecida como “Maria Louca“, mas sua história vai muito além desse rótulo. Filha de D. José I, ela foi a primeira mulher a governar Portugal com plenos poderes, subindo ao trono em 1777. Seu início de reinado foi marcado por forte religiosidade, uma postura mais conservadora e ações voltadas ao bem-estar social e à cultura.
Ela também ficou famosa por ter afastado o polêmico Marquês de Pombal, ministro de seu pai, e por buscar uma monarquia mais justa. Mas com o tempo, sucessivas perdas pessoais – como a morte do marido, de dois filhos e de seu confessor – mergulharam Maria em um estado de profunda depressão.
“Ela foi uma rainha extremamente religiosa, sensível, e sua condição emocional foi tratada com muito preconceito. Chamá-la de ‘louca’ foi uma forma de deslegitimar sua autoridade”, explica Ana Paula Aguiar, autora de História, Filosofia e Sociologia do Sistema pH.
Em entrevista à BBC, a historiadora Mary del Priore, autora de “D. Maria I: As Perdas e as Glórias da Rainha que Entrou para a História como ‘A Louca’”, conta que a religiosidade da rainha refletia a própria Portugal da época, que era mais fiel à Igreja Católica do que outros países europeus como França e Itália. Ela também reforça que a rainha era profundamente admirada pelos portugueses.
“D. Maria percorre essas procissões com o povo, ela se mistura ao povo nas festas religiosas, foi realmente a rainha adorada pelo povo português”, afirma.
A vinda da família real ao Brasil
O período do reinado de Maria I foi tudo, menos tranquilo. A Europa estava sacudida pelas ideias do Iluminismo, pela Revolução Francesa e pelos avanços da Revolução Industrial. E, como se não bastasse, Napoleão Bonaparte resolveu invadir Portugal.
Para escapar da invasão, a corte portuguesa decidiu, em 1808, fugir para o Brasil. A mudança de continente foi drástica e histórica. Com a chegada da família real ao Rio de Janeiro, os portos foram abertos às “nações amigas”, como a Inglaterra, o pacto colonial foi quebrado, e o Brasil passou a viver um processo de modernização.
Apesar de já estar afastada do poder, Maria I ainda era rainha quando tudo isso aconteceu. “Mesmo sem governar diretamente, foi sob o reinado dela que o centro do império português se deslocou para o Brasil. Isso teve um impacto imenso”, destaca a professora.
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“Maria, a Piedosa” ou “Maria Louca”?
No início, Maria I era chamada de “Maria, a Piedosa”, graças à sua dedicação religiosa e seu lado mais humano. Mas com o agravamento de sua saúde mental, a percepção pública mudou.
Segundo Ana Paula, a sociedade da época não compreendia transtornos mentais como a depressão. E mais: ver uma mulher no poder já era algo que incomodava. Com isso, sua fragilidade emocional virou munição para críticas misóginas e ataques políticos. “Ela sofreu com julgamentos extremamente cruéis. Sua depressão foi rotulada como loucura, e isso foi usado para afastá-la do poder”, afirma a professora.
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Mitos, choques e uma morte triste
Muitos dos exageros sobre Maria I foram perpetuados pela história. A tal “loucura” virou quase um carimbo em sua biografia. A verdade é que ela enfrentava um quadro grave de depressão, que hoje seria tratado de outra maneira e acompanhamento médico adequado.
Mas, naquela época, os tratamentos eram brutais: “banhos gelados, choques elétricos e camisa de força”, conta Ana Paula. Maria passou seus últimos anos reclusa no Convento do Carmo, no Rio de Janeiro, sem poder usar objetos religiosos para rezar.
“Ela viveu seus últimos dias em isolamento, oração e tristeza profunda. Foi uma morte muito sofrida, mas injustamente esquecida nas páginas dos livros”, lamenta Ana Paula.
Maria I morreu em 20 de março de 1816, aos 81 anos. Mas seu legado vai além dos estigmas: foi uma mulher forte, num mundo que não queria vê-la no poder.
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