Camila di Monaco é chefe de comunicação de uma empresa dedicada ao ramo do entretenimento. Nossa convivência nunca foi além de “olás” trocados entre uma exibição ou outra para a imprensa, mas recentemente ela chamou a minha atenção – e não foi algo relacionado a trabalho. Durante um dos meus rasantes pelas redes sociais, eu a vi empunhando um majestoso violoncelo.
Curioso, perguntei sobre o porquê do instrumento. Ela então explicou que sempre foi apaixonada pelo som do violoncelo – tem gente da família que toca em orquestra –, mas passou a se dedicar a essa paixão depois que a escola em que sua filha estuda criou uma orquestra formada por pais de alunos.
O artefato eternizado por Jacqueline Du Pré foi uma escolha natural. Mas a profissional de imprensa percebeu também que esses momentos dedicados à música não apenas ajudam a realizar seu sonho como também preparam sua alma para o estresse que ela enfrenta em seu dia a dia – e quem mora numa grande capital sabe exatamente do que estou falando.
Bem, desde os tempos em que o então pastor de ovelhas Davi fez uso de sua lira e de seu canto para aplacar as dores do rei judeu Saul, cerca de mil anos anos antes de Cristo (estou na fase de seriados bíblicos), que sabemos do poder da música em passar uma sensação de paz e alívio. Nos últimos tempos, contudo, estudos mostram que suas propriedades vão além de causar bem estar.
O afinco com o qual Camila se dedica ao violoncelo me fez lembrar de uma conversa com Fernando Quesada, músico e detentor da franquia de uma escola de rock. Ele revelou que houve um aumento de 33% na matrícula de adultos. Desses, 65% mencionaram o interesse por uma atividade para diminuir o estresse e a ansiedade. O colégio é procurado também por jovens, cujos sonhos estão além de se tornarem músicos virtuosos ou criar uma banda. Cerca de 25% dos matriculados entre 10 e 14 anos procuram a escola pelos mesmos motivos que os alunos de idade adulta.
E a música ajuda? Segundo o terapeuta junguiano Luiz Couto, o estresse pode ser compreendido como “tensão estendida no tempo”. E quanto maior a intensidade da tensão e maior sua extensão no tempo, maior o perigo para a saúde física e mental. O ato de cantar, tocar um instrumento ou cantar e tocar promove uma quebra na corda esticada do stress.
A conversa com Fernando me levou a outro estudo interessante, dessa vez o da Anafima (Associação Nacional da Indústria da Música). Apoiado em teses de entidades importantes – entre elas a Escola de Medicina da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos –, ele defende o estudo musical como método terapêutico no tratamento de, por exemplo, ansiedade, depressão, Tdah (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade) e esquizofrenia.
Uma das ideias de Daniel Neves, presidente da instituição, é justamente incentivar a propagação da cultura musical – que pode vir do patrocínio a projetos de musicoterapia em hospitais, doação de instrumentos a clínicas ou advogar por mais educação musical nas escolas.
Sempre acreditei no poder curativo da música, ainda que sem ajuda terapêutica. O impacto que cada canção ou obra erudita provocou em mim me fez aprimorar meus estudos nesse ou naquele movimento. Foi assim com Beatles na infância e Chico Buarque e Caetano Veloso no início da adolescência; o rock pesado de Led Zeppelin e Black Sabbath e o reggae de Bob Marley e Aswad ou, mais recentemente, a Oitava Sinfonia, de Anton Bruckner, com a Filarmônica de Berlim regida por Nikolaus Harnoncourt e as improvisações ao piano do americano Brad Mehldau. Mais recentemente, o documentário Milton Bituca Nascimento, da cineasta Flávia Moraes, fez com que eu voltasse a escutar Milton e o Clube da Esquina de modo quase compulsivo.
O melhor dessa pesquisa foi descobrir que mesmo quem não possui fundos suficientes para estudar numa escola de música pode ter acesso às propriedades terapêuticas dessa arte. Basta dedicar alguns minutos de seu tempo à uma composição de boa qualidade ou até mesmo cantar. Sabem aquele ditado “quem canta, seus males espanta”? Pois é, nossos avós tinham razão.
Camila, a gerente de imprensa que estuda violoncelo, me conta animada da mini orquestra de pais instrumentistas. Diante de tanta empolgação eu me pergunto quando terei coragem de retomar minhas aulas de piano – queria virar uma espécie de Elton John tropical – e tocar pelo menos o primeiro movimento da Moonlight Sonata, de Beethoven, e Easy, do grupo de soul music Commodores.