Um novo estudo realizado por pesquisadores brasileiros e espanhóis, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), mostrou que os vapes não são só responsáveis por doenças cardiorrespiratórias, mas também por alterar a composição da saliva dos usuários, aumentando o risco de cáries, lesões da mucosa na cavidade oral e doença periodontal, uma das principais causas de perda total de dentes.
A venda e importação de cigarros eletrônicos é proibida no Brasil desde 2009. Apesar dessa medida da Anvisa, quatro milhões de brasileiros já usaram vape, segundo dados de 2023. Os dispositivos são facilmente comercializados na internet e até em bancas de jornal. (Melhor comprar uma edição da Superinteressante no lugar – seu bolso e sua saúde agradecem).
A nova pesquisa, publicada no International Journal of Molecular Sciences,foi feita a partir do doutorado de Bruna Fernandes do Carmo Carvalho, no Instituto de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (ICT-Unesp).
Um em cada quatro jovens afirmou já ter usado algum tipo de cigarro eletrônico. Mais práticos que os cigarros normais, com diversos sabores e sem embalagens assustadoras – mas verdadeiras – que mostram as consequências do uso dos produtos, os vapes são a droga de escolha para muitos jovens que nem enxergam aquilo como uma droga.
Os cigarros eletrônicos surgiram para ajudar a parar com o tabagismo. As pesquisas mais recentes sobre o assunto têm mostrado que os dispositivos não ajudam a parar de fumar, aumentam a dependência de nicotina e podem causar vários danos à saúde.
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Vape pode aumentar risco de cáries
O estudo, realizado em parceria com pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha, acompanhou 50 jovens sem problemas visíveis na mucosa oral, com idade média de 26 anos. Metade deles eram usuários regulares e exclusivos de cigarros eletrônicos há pelo menos seis meses, e a outra metade, o grupo-controle, não usava vapes.
Todos os voluntários ofereceram amostras de saliva, e os pesquisadores analisaram a viscosidade, o pH e a concentração de cotinina. Cotinina parece um anagrama de nicotina, certo? Não à toa: ela é uma substância originada pelo metabolismo da nicotina no organismo humano, e serve como biomarcador do uso da droga. É como se nosso corpo ingerisse nicotina, embaralhasse as sílabas e produzisse cotinina.
Além dos testes da saliva, os participantes do estudo foram submetidos a análises clínicas tradicionais, que medem coisas como frequência cardíaca, oximetria, glicemia, concentração de monóxido de carbono (CO) no ar exalado e ingestão de álcool.
Os pesquisadores encontraram níveis altos de cotinina na saliva dos usuários de vape, além da presença de 61 metabólitos (substâncias produzidas pelo metabolismo de outra no organismo) exclusivos à saliva dos fumantes hi-tech. Quatro biomarcadores específicos eram maiores no grupo de usuários de cigarros eletrônicos: ácido esteárico, ácido elaídico, ácido 3-fenilático e valina.
Esses biomarcadores podem ajudar na detecção precoce de alterações de saúde causadas pelo metabolismo de substâncias químicas estranhas ao corpo, como acontece no uso dos vapes. O impacto de saúde dos cigarros eletrônicos ainda não está 100% claro, mas os pesquisadores percebem que eles estão relacionados a inflamações. Vias inflamatórias ligadas à doença periodontal podem ser induzidas pelo uso dos vapes.
O fluxo de saliva dos usuários de cigarros eletrônicos tendia a ser menor em comparação com os não-fumantes. Isso pode ter relação com a presença de aromatizantes nos vapes, cheios de substâncias como propilenoglicol e glicerina que irritam as vias aéreas superiores – laringe, faringe e nariz – e deixam as mucosas ressecadas.
Além disso, a saliva dos fumantes de cigarros eletrônicos era menos viscosa, fator importante para proteger e hidratar a boca. Isso e a redução de fluxo salivar favorecem a formação de biofilme, película que surge quando falta higiene dental, e que facilita o surgimento de cáries.
Os problemas não eram só bucais: os usuários de vape também tinham um nível maior de monóxido de carbono no ar exalado e uma oximetria menor, o que significa que os glóbulos vermelhos do sangue estão carregando menos oxigênio. Fumantes de cigarro eletrônico também relataram um uso de álcool maior. 76% dos participantes do estudo bebem e fumam vape simultaneamente.
Dos jovens que participaram do estudo, só 24% dos usuários de vape eram ex-fumantes do cigarro tradicional. 52% diziam usar o produto diariamente, e os produtos favoritos eram aqueles com sabores doces ou de frutas – o gostinho bom ajuda a esquecer os prejuízos à saúde que os cigarros eletrônicos causam.
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